A Justiça do Trabalho não tem demonstrado forte resistência à aplicação da reforma trabalhista (Lei nº 13.467, de 2017), que completa um ano no dia 11.
Em meio à crise econômica, porém, as mudanças da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) parecem não ter gerado o impacto esperado para o mercado de trabalho. No período de vigência da norma, o saldo de empregos é de 372.748 vagas formais, ante uma expectativa de 2 milhões nos dois primeiros anos – número divulgado à época pelo então ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira.
As informações do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho, de acordo com o procurador-geral do Trabalho, Ronaldo Curado Fleury, demonstram que a principal alegação do Ministério Público, de que a alteração não geraria mais empregos, se confirmou. Na época da aprovação da norma, Fleury mencionava estudos da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e da Organização Internacional do Trabalho (OIT) para demonstrar que países em crise econômica, como o México e a Espanha, que passaram por flexibilizações das leis trabalhistas não conseguiram aumentar seu contingente de empregados formais.
“O desenvolvimento econômico é que cria empregos e não a flexibilização dos direitos”, afirma Fleury. “A empresa só vai contratar mais trabalhadores se tiver mais demanda, se precisar produzir mais. E as contratações não dependem do preço da mão de obra”, acrescenta o procurador-geral.
Os números sobre contratação de trabalho intermitente – nova modalidade prevista na reforma trabalhista -, segundo o advogado da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Força Sindical e Nova Central Sindical dos Trabalhadores, José Eymard Loguércio, ainda indicam “precarização do trabalho”. O saldo de intermitentes entre admissões e demissões no período é de 35.930.
Há notícias, acrescenta Loguércio, de empregados que firmaram acordos na demissão para serem posteriormente contratados pela mesma empresa ou por outra terceirizada como intermitentes. Nesses casos, o trabalhador que recebia um salário fixo mensal e seus reflexos, agora passa a receber apenas pelas horas trabalhadas, quando solicitado.
“Este ano não se fez nada. Acredito que com a guinada econômica que deve acontecer nos próximos anos, e não estou falando de política, deve aumentar o número de contratações”, diz. Furlan afirma que desde 2017 há uma certa melhora, que deve se fortalecer a partir de 2019.
A lei, apesar disso, acrescenta Furlan, “foi um avanço, independentemente do período de maturação que ela vai passar para ser aplicada em sua plenitude”. Para ele, a norma modernizou as relações de trabalho para que sejam compatíveis com as formas atuais de produção.
A geração de vagas intermitentes, segundo Furlan, já trouxe muitos que trabalhavam na informalidade para o mercado de trabalho.
” É o caso do garçom que trabalha no restaurante durante a semana e faz um bico em buffet em fins de semana”, diz. Para o procurador-geral Ronaldo Fleury, porém, as vagas que estão sendo criadas já têm gerado uma precarização. Segundo Fleury, o salário médio mensal é de R$ 1,4 mil.
Ainda é necessário regulamentar melhor o contrato intermitente, de acordo com Fleury, já que da forma como está o trabalhador não tem garantia de receber pelo menos um salário mínimo por mês e, mesmo assim, terá desconto previdenciário. Mas não terá direito a benefício da seguridade social. “Esse trabalhador está num limbo jurídico. Ele mesmo tem optado pela informalidade para não ser contratado.”
Outros pontos da reforma trabalhista que já são realidade são a divisão de férias em mais de um período e a instituição de banco de horas individuais. A tão esperada terceirização, porém, ainda engatinha. A justificativa é que muitos empresários ainda aguardavam o aval do Supremo Tribunal Federal (STF), o que só ocorreu em agosto.
Segundo Furlan, em pesquisa da CNI, realizada em 2016, 63% das indústrias afirmavam utilizar serviços terceirizados e 84% pretendiam aumentar a terceirização, desde que fosse aprovada por lei.
Para ele, no entanto, não deve haver uma “terceirização desenfreada”. Áreas estratégicas do negócio da empresa não devem passar por terceirização. “Uma empresa de alimentos não vai terceirizar o chefe de controle de qualidade. Uma escola não vai terceirizar todos seus professores. Ninguém é louco de prejudicar seu próprio negócio.”
Existem companhias que até resolveram rever terceirizações. “Há empresas que chegaram a conclusão que ter vigilância própria desarmada na portaria acabava sendo mais barato que terceirizar”, afirma. Porém, segundo Furlan, a vantagem de se terceirizar é que, em caso de falta, a prestadora de serviços é obrigada a mandar outra pessoa.
Apesar da questão já estar definida no Supremo, a decisão ainda não foi publicada e ainda cabe recurso (embargos de declaração) para esclarecimento de alguns pontos, segundo o presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), João Batista Brito Pereira. Até então, a jurisprudência no TST era contrária à terceirização de atividade principal (atividade-fim). Há inclusive súmula (nº 331) neste sentido.
A fiscalização, segundo o procurador-geral do trabalho, continuará verificando casos em que há fraude à terceirização e precarização vultosa em prejuízo ao trabalhador e intermediação de mão de obra – quando o funcionário é escolhido e há apenas uma intermediadora, prática que continua não sendo permitida.
Segundo ele, após a entrada em vigor da reforma trabalhista, o número de denúncias em geral no Ministério Público do Trabalho aumentou em 12%.
“Isso não significa que todos usem as novas regras. Existem juízes que declaram inconstitucionais alguns pontos. Mas o que é mais polêmico ainda vai depender de decisão do STF”, diz. É o caso, por exemplo, do trabalho intermitente, da gratuidade da Justiça do Trabalho e do pagamento de honorários de sucumbência e periciais por trabalhadores.
Fonte: AASP